Retrospectiva Medidas Provisórias 2021
Apesar de ainda ter sido um instrumento político importante no governo Bolsonaro, o presidente apresentou, em 2021, apenas 69 medidas provisórias, um pouco mais da metade do volume se comparado a 2020. Naquele ano, foram publicadas 108 MPs, número muito influenciado pela pandemia.
Em 2021, o foco foi a implementação de programas governamentais, alguns deles ainda voltados para suprir demandas criadas pela pandemia, como o Auxílio Brasil. Outros foram voltados a temáticas que estavam estagnadas até então, como o Programa de Autorizações Ferroviárias. A pauta dos combustíveis também atormentou o Executivo, que tentou amenizar o quadro por meio das MPs 1063/2021 e 1069/2021, que trataram da comercialização de combustíveis por varejistas.
Ressalta-se que, como reflexo do alinhamento entre o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP/AL), e Bolsonaro, excluindo as MPs de crédito, somente quatro medidas provisórias não foram convertidas em lei. A mais polêmica do ano acabou sendo a MP 1068/2021, que regulamentava as redes sociais, e que chegou a ser devolvida pelo presidente do Congresso Nacional, Rodrigo Pacheco (PSD/MG), durante um dos momentos de maior tensão entre o Senado e o Planalto.
MPs dos Combustíveis
Numa tentativa de estabilizar os preços dos combustíveis, o governo publicou a MP 1063/2021, que passou a permitir a venda direta de etanol pelos produtores ou importadores aos agentes distribuidores. A medida previa que tal mudança só seria válida a partir de regulamentação da Agência de Petróleo, Gás e Biocombustíveis (ANP) todavia, para acelerar esse processo, foi enviada a MP 1069/2021, que deixou a regulamentação a cargo de decreto presidencial, enquanto não acontecesse por meio da ANP. A MP 1063/2021 foi aprovada pelo Congresso e remetida à sanção, porém, a matéria não gerou alívio considerável no bolso do consumidor e a questão dos combustíveis seguirá sendo uma pedra no sapato do governo em 2022.
MP das Ferrovias
Na busca por acelerar o PLS 261/2018, em trâmite no Senado desde o início da legislatura e sob a relatoria do senador Jean Paul Prates (PT/RN), o governo publicou a MP 1065/2021, que permitiu a utilização do modelo de autorização para a construção de ferrovias. A publicação da MP não agradou senadores, que preferiam deliberar o projeto da Casa. Dado o cenário, foi costurado acordo com o Ministério da Infraestrutura para que a tramitação do PLS 261 fosse priorizada, em detrimento da MP. Para isso, o projeto seria deliberado antes da perda de vigência da medida. O acordo foi bem-sucedido, o PLS foi aprovado no final de 2021 na Câmara e no Senado e, com isso, a MP poderá caducar sem que o governo perca os benefícios da política já em implementação.
MP do Auxílio Brasil
Com o fim do auxílio emergencial, instituído como resposta às consequências da pandemia, o governo decidiu estabelecer um benefício que substituísse o Bolsa Família, e nesse contexto foi enviada ao Congresso a MP 1061/2021, que instituiu o Auxílio Brasil. Numa jogada estratégica do planalto, já mirando as eleições de 2022, o programa foi ampliado e passou a garantir o valo de 400 reais para as famílias inscritas. Esse passo, contudo, não foi simples, pois foi preciso estipular de onde sairiam esses recursos. Foi nesse contexto que a PEC dos Precatórios ganhou uma importância ainda maior, tendo em vista que ela acabou sendo a solução para abrir espaço no orçamento para custear a iniciativa.
Perspectivas
Parlamentares precisarão se debruçar sobre quatro MPs na volta do recesso
Em 2022, os parlamentares deverão começar o ano deliberando medidas provisórias que perdem a vigência entre fevereiro e março. No total, sete MPs se enquadram nesse grupo: 1065/2021 (Marco das Ferrovias); 1066/2021 (prorroga prazo para recolhimento de contribuições ao setor de energia elétrica); 1067/2021 (atualiza coberturas de saúde complementar); 1069/2021 (altera a MP 1063/2021, da comercialização de combustíveis por varejista); 1070/2021 (institui o Programa Habite Seguro); 1071/2021 (reduz as alíquotas PIS/Pasep e Cofins na importação do milho); e 1072/2021 (altera o cálculo de Taxas de Fiscalização do mercado de valores mobiliários).
Dentre essas sete, três já não serão deliberadas (MP 1065/2021, MP 1066/2021 e MP 1071/2021), pois a aprovação não é mais necessária. O Marco das Ferrovias foi aprovado em ambas as Casas por meio do PLS 261/2018, do mesmo tema, e aguarda sanção presidencial. A MP 1066 já cumpriu com sua função de prorrogar os prazos a que se dispôs, encerrados em novembro. Da mesma forma, a MP 1071 reduziu alíquotas de impostos federais na importação do milho até dezembro de 2021, benefício que não deve ser renovado em 2022.
Das quatro medidas restantes, a com o prazo mais apertado para a deliberação é a MP 1067/2021, sobre a cobertura de saúde complementar, que vence no dia 10 de fevereiro. O tempo para a sua deliberação é curtíssimo, levando em conta a necessidade de ser aprovada nas duas Casas do Congresso ao longo das duas primeiras semanas da volta do recesso.
A MP 1069/2021, que altera a MP sobre revenda de combustíveis, já aprovada pelo Congresso, vence no dia 20 de fevereiro. O prazo também é curto para a deliberação de uma matéria na Câmara e no Senado, mas, tratando-se de um tema já discutido com maior profundidade pelos parlamentares, é possível que a matéria seja aprovada rapidamente nessas primeiras semanas de trabalhos de 2022.
A MP 1070/2021, que cria o Programa Nacional de Apoio à Aquisição de Habitação para Profissionais da Segurança Pública (Programa Habite Seguro) vence no dia seguinte à MP 1069: 21 de fevereiro. Essa medida ainda não teve a discussão iniciada pela Câmara, mas, tratando-se da criação de um programa para policiais, dificilmente será esquecida pelos parlamentares no início de um ano eleitoral.
Por fim, a MP 1072/2021, que altera o cálculo de Taxas de Fiscalização do mercado de valores mobiliários, perderá a vigência no dia 10 de março. O tempo para a sua deliberação é maior, o que oferece também à proposta uma margem maior de negociações entre Congresso e governo para sua aprovação. No entanto, a MP ainda não tem relator designado, o que obrigará o deputado responsável a correr com a elaboração de seu relatório durante o mês de fevereiro.
Vale ressaltar que os últimos dias de 2021 foram recheados de MPs. Para além das que vencerão entre fevereiro e março, o Congresso possui em sua conta outras 23 medidas a serem deliberadas. No entanto, como 18 delas foram apresentadas somente em dezembro, considerando o período de prorrogação, elas começarão a perder eficácia apenas a partir de maio.
2022 deve ser um ano tranquilo quanto à apresentação de MPs
Se durante os primeiros três anos do mandato de Bolsonaro as MPs foram bem utilizadas para a criação de programas importantes para o governo, como o Auxílio Emergencial, o Auxílio Brasil e o Programa de Manutenção do Emprego e da Renda, em 2022 a tendência é de que a publicação de MPs desse tipo seja menos comum. O primeiro motivo para isso parte das limitações impostas pela legislação eleitoral, que proíbe a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da Administração Pública que venham de programas sociais não autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior. Ou seja, o governo fica proibido de criar programas de transferência de renda, como os citados acima.
O segundo motivo pode ser explicado pela tendência de descontinuidade nas gestões dos ministérios para este ano. Dos 23 ministros, pelo menos nove devem se desincompatibilizar, ou seja, pedir para sair do respectivo ministério, até 02 de abril (data limite de acordo com o Tribunal Superior Eleitoral). A medida é necessária para as autoridades que pretendem concorrer a um cargo eletivo, provável caso dos ministros Tarcísio de Freitas (Infraestrutura), Tereza Cristina (Agricultura), João Roma (Cidadania), Marcelo Queiroga (Saúde), Fábio Faria (Comunicações), Gilson Machado (Turismo), Rogério Marinho (Desenvolvimento Regional), Flávia Arruda (Secretaria de Governo) e Onyx Lorenzoni (Trabalho). Com a debandada, que deve ser acompanhada por parte das equipes dos ministros, dificilmente um novo grande programa será criado este ano.